A Piraíba

A piraíba, elusiva e majestosa, torna-se mais do que um peixe nesta crônica — é o símbolo daquilo que acreditamos perdido na vida: a inspiração, a alegria, a esperança, ou mesmo a presença daqueles que amamos. Seu desaparecimento mergulha o observador na sombra da ausência, um espaço onde o silêncio se torna pesado, onde até o rio parece imóvel. Contudo, o seu retorno, “com um nado elegante e gracioso”, não é apenas a recuperação do peixe, mas uma ressurreição do próprio sentido.
A vida ensaia continuamente esse drama: o que pensamos extinto aguarda silenciosamente para ressurgir em outra forma. Perder é ser forçado à humildade de reconhecer nossa cegueira. Redescobrir é reaprender que a vida não se move em linhas retas, mas em espirais — onde as coisas desaparecem para retornar, transformadas, mas trazendo ainda a essência que as tornava preciosas.
A crônica nos lembra que a morte nem sempre é um fato externo, mas muitas vezes uma condição interior: a incapacidade de ver além das aparências, a necessidade de “provas palpáveis”. Na verdade, a vida pulsa mais forte quando vista de olhos fechados, quando confiamos além da evidência, na fé íntima de que o que é verdadeiramente vivo nunca desaparece.
Assim, o rio que Antonio batizou com o seu nome torna-se metáfora de todos os rios que correm dentro de nós. Cada um guarda seus peixes ocultos, suas piraíbas de alegria, que por vezes se recolhem às profundezas apenas para emergir de novo com uma graça inesperada.
A celebração na margem do rio, o brinde com vinho, é mais que amizade — é a afirmação da existência como corrente compartilhada. Guardar esses rios interiores, como as florestas guardam suas margens, é proteger a possibilidade da renovação, do renascimento, da descoberta.
No fim, o peixe, o rio, a floresta e a crônica nos dizem uma só verdade: as vitórias da vida não estão em segurar para sempre, mas em reconhecer o milagre do retorno.